1.12.2011

O que se deixa pra trás é o que mais dói...

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Acabei de ver um filme da minha terra, e a protagonista, Lilia Cabral, lá pelas tantas, perde uma amiga dela desde sempre. Vi e chorei. E pensei na minha amiga Baby. E chorei mais ainda.

Imigrar é uma coisa estranha. Me pareceu a melhor opção, mas para o que veio comigo e o que ficou, eu não estava preparada. O problema de imigrar é que você tem de deixar sua história pra trás. As partes ruins, você deixa com prazer, mas as partes boas, ah, essas doem. Foi o caso dessa minha amiga. Vendo o filme, eu vi o espelho de nossa amizade, vi que tivemos/temos uma amizade bem parecida, vendo roupas juntas, passando por dificuldades e alegrias, brigando, passando cremes, morrendo de rir, dançando (paixão de nós duas); mas não tenho minha amiga aqui para conversar sobre o hoje. Nem ela me tem lá. Interrompemos nossa história quando eu imigrei. Claro que tenho outras amizades, algumas quase tão intensas, mas aquela tem um passado. Amizade daquelas que se diz: "lembra?" ou "você era..."

A Baby me ligou quando sua mãe faleceu. Eu ainda morava lá. Em um momento tão descabelado, eu fui a pessoa em quem ela pensou e isso foi muito honroso pra mim. E eu fui para o lado dela. Mas e agora, se outro alguém de nossas vidas se vai, teremos à mão o telefone da outra? Pensaremos na outra? Isso dói pensar.

Quando fui ao Brasil, retomei minha conversa com ela no ponto onde havíamos deixado. Não há hiato, apenas continuamos, como se desapertássemos a tecla pause de nossa conversa. Apenas agora eu tenho mais coragem de dizer-lhe meus sentimentos abertamente, dizer que a amo, que ela é minha melhor amiga.
Se eu interrompi nossa história, pelo menos agora eu tenho coragem de dar-lhe o tamanho exato de sua importância e talvez por isso, ainda seguimos construindo uma história à distância, intercalada e intermitente, mas firme e profunda como sempre. Uma amizade repaginada, reformada, imigrada.

3 comments:

Jacques said...

Sentimentos de imigrantes. Chorei. Me identifiquei. Amei!

tatiana said...

minha amiga ana (niteroiense também, claro) mandou o texto abaixo simplesmente maravilhoso:

OS AMIGOS INVISÍVEIS
Fabrício Carpinejar

Os amigos não precisam estar ao lado para justificar a lealdade.
Mandar relatórios do que estão fazendo para mostrar preocupação.

Os amigos são para toda a vida, ainda que não estejam conosco a vida
inteira. Temos o costume de confundir amizade com onipresença e
exigimos que as pessoas estejam sempre por perto, de plantão. Amizade
não é dependência, submissão. Não se têm amigos para concordar na
íntegra, mas para revisar os rascunhos e duvidar da letra. É
independência, é respeito, é pedir uma opinião que não seja igual, uma
experiência diferente.

Se o amigo desaparece por semanas, imediatamente se conclui que ele
ficou chateado por alguma coisa. Diante de ausências mais longas e
severas, cobramos telefonemas e visitas. E já se está falando mal dele
por falta de notícias. Logo dele que nunca fez nada de errado!

O que é mais importante: a proximidade física ou afetiva? A
proximidade física nem sempre é afetiva. Amigo pode ser um álibi ou
cúmplice ou um bajulador ou um oportunista, ambicionando interesses
que não o da simples troca e convívio.

Amigo mesmo demora a ser descoberto. É a permanência de seus conselhos
e apoio que dirão de sua perenidade.

Amigo mesmo modifica a nossa história, chega a nos combater pela
verdade e discernimento, supera condicionamentos e conluios. São
capazes de brigar com a gente pelo nosso bem-estar.

Assim como há os amigos imaginários da infância, há os amigos
invisíveis na maturidade. Aqueles que não estão perto podem estar
dentro. Tenho amigos que nunca mais vi, que nunca mais recebi
novidades e os valorizo com o frescor de um encontro recente. Não vou
mentir a eles (vamos nos ligar?) num esbarrão de rua. Muito menos dar
desculpas esfarrapadas ao distanciamento.

Eles me ajudaram e não necessitam atualizar o cadastro para que sejam
lembrados. Ou passar em casa todo o final de semana e me convidar para
ser padrinho de casamento, dos filhos, dos netos, dos bisnetos. Caso
encontrá-los, haverá a empatia da primeira vez, a empatia da última
vez, a empatia incessante de identificação. Amigos me salvaram da
fossa, amigos me salvaram das drogas, amigos me salvaram da inveja,
amigos me salvaram da precipitação, amigos me salvaram das brigas,
amigos me salvaram de mim.

Os amigos são próprios de fases: da rua, do Ensino Fundamental, do
Ensino Médio, da faculdade, do futebol, da poesia, do emprego, da
dança, dos cursos de inglês, da capoeira, da academia, do blog.
Significativos em cada etapa de formação. Não estão em nossa frente
diariamente, mas estão em nossa personalidade, determinando, de modo
imperceptível, as nossas atitudes.

Quantas juras foram feitas em bares a amigos, bêbados e trôpegos?
Amigo é o que fica depois da ressaca. É glicose no sangue. É
serenidade.

Thinker said...

Obrigada, Tatiana! Esse poema é um presentinho!
Estou com saudades hoje. Saudades de uma coisa indefinida, mas que me deixa frágil e com vontade de chorar. Será que é de Niterói?
(E sei que era vc a anônima no outro comentário (pelo estilo...))
Beijos, amiga!