3.22.2006

Pois é!

Aí, então! Estive tão ocupada com tudo, faculdade, trabalho que deixei o blog de lado por uns dias, mas estou de volta. Queria ter coisas mais interessantes pra dizer, mas...
Saudades do Brasil, muitas saudades. O tempo parece voar, mas não a vida: a mesmice do dia-a-dia se mostra massacrante. Mais porque o que vem não é desejado. Que as crianças e adolescentes ao meu redor vejam em mim o resultado de não dedicar-se ao que se gosta e que sigam em frente em seus sonhos e prazeres.
Que eu me lembre disso quando falar com eles e com meu filhão.

3.13.2006

Letras

Cercanias de mim,
Mensagens insólitas
E idiotas a meu respeito,
Minha mente não me deixa desbravar meus louvores
Não me deixa desfrutar do doce
Nem do amargo.
Minha mente não me permite sorrir,
Nem me permite repetir
Porquê não consigo decorar
Minhas próprias letras e sentenças
Repletas da palavra emprestada
Que tomo em minhas mãos
E manipulo como barro mole
Nas mãos do principiante ceramista?
Um misto de potencial e desajeito,
De vontade e desrespeito
Assim, vou não sendo,
Encolhendo em cantos escuros
Repetindo o que era esperado de mim:
O não ser.

3.08.2006

Women's day

Today is women's day. A day to re-think our paths and definitions of life, love and everything else. Today, maybe, we should question the double and third journeys we women are in. Today is a day for us to remind our people at home how we are special, sensitive, wonderful and more, much more. How much we are pieces and unit, parts and the whole. How much we are paper and stone. Fruits and roots, power and weakness. We are all that. And sometimes we are still treated as if we were nothing. Today is a day to scream out loud. At least today. Courage.

PS.: These words are for those women that unfortunately don't have love, care, respect, dignity...

3.03.2006

Controle

Não existe controle real de nada, mas sim uma falsa idéia de controle embebida na cegueira do poder. O tempo é a prova real da impossibilidade de controle.

3.02.2006

A poesia

A poesia é deslocada da palavra,
da atitude, da idéia.
Se esconde entre teias antigas,
escuras, passadas.
A poesia se desintegra
( e se integra)
na parca luz do ser,
Para renascer inteira
a cada amanhecer.
Desse ponto voa livre
(e inalcançável)
Aos simples humanos
Que tanto a almejam.
E daí recomeça todo o ciclo
De retorno, integração,
esconderijo e liberdade.
Eterno, cansativo,
Desesperador
Desesperançador
Finalizador dos dias eternos que vivemos.

Pequena consideração sobre a saudade

A saudade distorce os caracteres das coisas e das pessoas. A saudade aumenta qualidades e apaga lentamente os erros e defeitos. A saudade aumenta a quantidade de dias de sol e
dominui os dias tristes e chuvosos. A saudade limpa praias poluídas e refloresta encostas
devastadas. Devolve peixes aos rios e risos às bocas. Devolve a esperança. A saudade viaja nas músicas e nas fotografias, nos cheiros e nas cores. A saudade embebeda e amolece corações.
A saudade turva a mente e deixa de ser somente uma emoção para virar estorvo, peso, que se
alivia quando e tão somente quando se mata a saudade.

3.01.2006

Viajando...

Bem, o dia de trabalho está no fim, o dia lá fora está maravilhoso, nem frio fez. Aqui, envolvida em papéis que ameaçam me devorar, vou indo em frente com certa preguiça, mas contente de ter visto e falado com meu filho.
Fomos almoçar juntos e foi simplesmente ótimo. Do jeito que gosto dele e do jeito que penso que sempre deveria ser.
San Francisco é uma cidade fascinante e tanta coisa acontece que fica complicado explicar. Mas fácil de entender porque tantas pessoas escreveram, escrevem e cantam sobre esse lugar.
Hoje, o céu azul, está realmente combinando com meu espírito.
Beijos a todos.
Serei mais frequente aqui.

8.23.2005

Assim, do nada

Bem ali estava,
Envolvida ainda em sedas macias
E perfumes raros.
Bem ali estava,
Lendo um bom livro e
Ouvindo música suave.
Ali, bem ali estava,
Quando o vento do desenrolar de fatos bravios
Soprou em minha direção
E susteve no ar toda a emoção reconstruída a duras penas
E reteve a respiração,
Esperando o momento do abate.
Que nunca vem, nunca chega
E faz a vida ter essa sensação de urgência,
De coisa ferida, desenganada.
E é sempre assim, do nada,
Do obscuro mundo do nada.
E emperra a criatividade tão necessária.

Sem Saber Porquê

Sem saber porquê
Dormi de vestido longo
E maquiagem no rosto,
De saltos meio descalços
E cabelos desgrenhados.
Sem saber porquê,
Cheirei e chorei fronhas
Travesseiros, lençóis,
Edredons.
Sem saber bem porquê
Deixei me levar por tudo
Todos
E acordei confusa,
Com uma dor de cabeça ancestral
Uma fome animal
E nem sabia mesmo quem fui.
Certamente sabia, porém, quem sou.

As Cores de Matilda

A casa vitoriana branca dominava imponente o jardim estreito. Era uma casa alta, com uma escada estreita que levava até a porta principal lá no alto. A pintura mostrava a passagem do tempo e as janelas há tempo não viam água. O cimento quebrado do piso do pátio sem sol estava limpo e havia flores ao longo dos muros. Alguns canteiros exibiam ainda umas plantas tristes. A mesa no centro da área cimentada estava repleta de iguarias, bolos, danishes, croissants, struddel, um pouco de cada canto do mundo ali reunido.
Neste instante a porta da casa se abriu e surgiu Leo com seu terno imponente, meio gasto, meio fora de moda, um pouco apertado na barriga, mas estava muito elegante e distinto, um tipo de velho gentleman. No Rio, seria um malandro da velha guarda. Estava já em seus cinqüenta e tantos, se não sessenta anos, mas tinha o gestual mais jovem, um olhar ainda brilhante. O cabelo, bem arrumado, tinha um topete que fazia uma volta e ia para trás, aumentando a sensação do esmero que ele cuidou em ter naquele dia. Demonstrou uma alegria pouco comum aos americanos quando viu as pessoas reunidas no jardim, esperando a abertura da porta. Sua voz tinha um timbre falso, como se estivesse modificando a voz, meio fanho, meio infantil. Não combinava. Fez um trejeito pouco original e desceu as escadas como um personagem de teatro absurdo. Fazia mesuras e trejeitos típicos do ator desfocado. Deslocado. Ou fora da vida.
Assim fomos apresentados e assim entramos em seu mundo.
No momento seguinte, apareceu Matilda no alto da escada e chocados ficamos ao percebê-la tão idosa. Vestia um casaco verde musgo meio desbotado e uma camisa com um estampado tipo Pucci nos mesmos tons. Uma saia preta velha, sandália preta de couro pesado e meias verdes, grossas, completavam o visual desconcertado dela. Trazia um cabelo desgrenhado, com franjas mais curtas do que deveriam, mal-cortadas e despropositadas para a idade dela. O bigode, muito maior do que deveria ser em uma mulher, não era descolorido há séculos. Tinha uma face estritamente européia, não era uma mulher comum, definitivamente. Os olhos azuis iam e vinham, mostrando a atividade mental e a percepção daquilo que acontecia ao seu redor, muito embora várias palavras já lhe fugissem à memória e pessoas e lugares não lhe fossem mais tão familiares. Refugiava-se pouco a pouco nos doces desvãos da senilidade. Era ela própria dramaturga e atriz, escrevendo e vivendo seu próprio destino ali, com Leo, muitos anos mais novo, mas fiel como cão velho.
Matilda era mulher, claramente mulher. E artista. Uma inglesa velha com alma de artista e profundamente feminina. Ela poderia ser mãe, avó, bisavó, e nem sei se teve filhos.
Cumprimentou-nos de maneira calorosa e seu sotaque inglês soou como música no meio de tantos outros sotaques ali presente. Pronunciava as palavras do jeito que provavelmente o próprio Shakespeare pronunciava, o que aumentou ainda mais a sensação teatral da cena que vivíamos. Muitas vezes eram palavras fora do uso cotidiano nesse país da pressa, soando, seu inglês, fora do tempo, mas lindo.
Nos convidaram à subir e ver as pinturas, as aquarelas e óleos que Matilda pintava como ninguém. A casa estava aberta, uma vez que seu estúdio funcionava em sua sala de estar.
A sala tinha poucos móveis, e esse poucos carregavam uma grossa poeira secular. Vidros de perfume abertos, batons destampados e outras quinquilharias de mulher estavam espalhados em cima do aparador da entrada com a mesma camada grossa de pó em cima. Vidros de diferentes formatos e tamanhos eram vistos por todo o lado. O tapete gasto e sujo mostrava o ir e vir de muitos e muitos anos. Cheirava a gato. Aliás tudo cheirava a gato. Nem mesmo o cheiro da tinta à óleo conseguia ser percebido naquele ambiente com cheiro de gato.
As pinturas estavam por toda a parte, literalmente: chão, mesa, cadeiras, parede. Onde se olhasse, lá estava mais um quadro. As aquarelas com sua serenidade característica, mostravam cenas da cidade em que vivíamos. Os óleos traziam retratos da própria Matilda, do Leo e de outros que encomendaram, como a mulher negra, retratada sorrindo meio sem graça e com uns olhos tão cheios de raiva. Ou dor. Cores intensas, de todos os matizes, esplhavam-se pelas telas como se não houve outro destino para elas, mas somente repousarem eternamente nas telas de Matilda. Eram seu habitat e ali estavam.
Aos quadros prontos, se misturava todo o material usado, revistas, livros e histórias, muitas histórias.
Matilda lembrava onde pintou cada um, e explicava exatamente o que viu e viveu, embora ali estivesse pra que víssemos em suas pinturas. Explicou que pintou um certo barco na parte detrás de um restaurante caro e que mesmo assim pediu-lhes água para a aquarela. E riu muito do inusitado da coisa. A pintura também era linda.
Leo ouvia algumas das histórias, novamente encantado com sua mulher. Circulava e conversava com as pessoas como um perfeito anfitrião de outra época.
Curioso como nenhum quadro tinha preço. Parecia que ela não queria que eles se fossem, parte de sua vida se despregando, saindo de seu controle. A sensação que tive era de que Matilda queria manter-se viva através daquilo que criava e vender não era exatamente o que lhe ocorria. A necessidade de dinheiro, porém, era visível, quase sólida. Não perguntei o preço dos quadros que gostei por sentir-me invadindo sua intimidade. Não poderia. Nem sei se poderia pagar.